Sentada na sala de espera do aeroporto, observei duas pessoas sentarem-se ao meu lado. Pela conversa, eram claramente colegas de trabalho.
Nitidamente chateados, compartilhavam entre si a indignação pelas horas excessivas e desnecessárias dedicadas a um relatório. Haviam utilizado muitas horas além de suas jornadas habituais de trabalho para realizar um estudo comparativo dos últimos 12 meses de vendas para descobrir, somente ao entregarem o relatório, que o comparativo do último trimestre já atenderia a necessidade do gestor.
A conversa alternava entre críticas à falta de clareza do gestor, farta oferta de “evidências” sobre a sua “culpa” e suas consequências para os dois com alguns lampejos de auto questionamento sobre o que eles poderiam ter feito para evitar a situação. Seguiram nesse jogo de caça aos culpados, ora acusando, ora defendendo.
Mas o que me chamou a atenção, de verdade, foi um verbo que foi exaustivamente repetido em todas as conjugações possíveis na conversa entre os dois rapazes: o verbo “achar”. Esse verbo transitivo refere-se a encontrar, descobrir, considerar, mas também a julgar ou supor, e aí começam os problemas.
Utilizamos julgamentos e suposições em nossas relações interpessoais com bastante frequência e, em virtude disso, não raro, os consideramos como fatos e verdades que direcionam nossos pensamentos e ações.
Nossos julgamentos e suposições distorcem a realidade e nos impedem de ver o todo, limitam nosso entendimento e induz a conclusões errôneas que podem esgotar nossas energias e nos direcionar para conflitos, retrabalho, improdutividade e stress.
Em outras palavras, achamos que sabemos.
Achamos que sabemos o que o outro quer baseados em suas declarações fora de contexto, em situações passadas ou em interpretações sob a luz do nosso próprio quadro de referências. Mas isso é realidade? Nem sempre temos conhecimento das intenções, interesses e dificuldades daquele que trabalha todos os dias ao nosso lado, e não porque ele esteja sonegando informações, mas porque está tão conectado em demandas maiores, em seus receios e dificuldades, que não consegue perceber que não foi claro o suficiente.
Martha Medeiros em seu livro “Feliz por Nada” fala que achamos que sabemos decodificar sinais, perceber humores, adivinhar pensamentos e que às vezes até acertamos, mas erramos tanto… Achamos que sabemos o que as pessoas pensam de nós. Achamos que sabemos compreender, aceitar, amar, achamos que sabemos conviver e achamos que sabemos quem de fato somos, até que somos pegos de surpresa por nossas próprias reações.
Achar definitivamente NÃO É o mais longe que podemos ir nesse universo repleto de segredos, sussurros, incompreensões, falas pela metade, urgências, desordens emocionais, sentimentos velados, todas essas abstrações que não podemos tocar, pegar nem compreender com exatidão. Mas nos conforta achar que sabemos. E nesse conforto, mora o risco constante de repetirmos mais do mesmo e ficarmos no mesmo lugar.
Em um idioma como o nosso, com aproximadamente 435 mil palavras (verbetes) e mais de 10 mil verbos, certamente podemos experimentar alternativas ao verbo “Achar”. Podemos questionar, esclarecer, validar nosso entendimento, buscar informações adicionais. Podemos explicar, informar, comunicar.
Podemos compartilhar nossas expectativas, desejos, anseios e podemos partilhar nossas dificuldades, receios e limitações também. Podemos também pedir. Sim, nós podemos pedir! Pedir o que queremos, de forma clara, explícita, direta, sem rodeios, sem encenações. Podemos pedir ajuda, pedir colo, pedir apoio.
Podemos muito!
Podemos mudar, podemos transformar, podemos escolher, podemos experimentar. Para Eric Berne, criador da Análise Transacional, agimos como adultos quando pedimos e damos informações atualizadas no aqui e agora.
Acredito que vale deixar de lado o verbo “achar” e experimentar algo novo, uma vez que temos muitas opções ao nosso dispor!
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